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quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Avenida Paulista: preconceito ou ódio

Avenida Paulista: preconceito ou ódio?

Alguns termos de nossa língua permitem usos e interpretações que frequentemente levam a sofismas (raciocínios incorretos), mas talvez, poucos como o termo "preconceito". Rigorosamente, preconceito é tão somente uma idéia, que habita o íntimo da pessoa, e trata-se de um conceito ou juízo pré-concebido, ou seja, um juízo que precede a apreensão e o termo, fases iniciais do raciocínio. Portanto, podemos dizer que o preconceito é o antirraciocínio, ou o que contraria as leis da lógica, pelo menos da aristotélica.

Atitudes violentas e deploráveis, como por exemplo as perpetradas pelo nazismo no século XX e outras agressões como por exemplo a recente ocorrida na Avenida Paulista (S.Paulo/SP), onde homossexuais foram espancados, são por vezes atribuídas ao "preconceito" contra este ou aquele. Aqui, confunde-se preconceito com ódio e agressão, estas sim, atitudes orientadas e dirigidas, volitivas, e portanto, fora do campo das idéias, e pertinentes ao campo das ações.

Ninguém pode ser condenado por ser preconceituoso. Na verdade, todos nós somos. O tal "conceito", ou o juízo formado, é atitude do intelecto resultante da aquisição de informações do meio, da simbolização mental consequente e da formulação lógica e ética. Se admitirmos por definição que ninguém é capaz de apreender toda a realidade sobre algum assunto ou fato, rapidamente verificaremos que temos mais preconceitos do que imaginamos.

Também não pode ser condenado aquele que diz "não gosto de marcianos", mesmo que seja a mais preconceituosa das assertivas. Todos fazemos escolhas na vida, por critérios declarados ou não, continuamente, e a maioria delas, por preconceitos. Totalmente diferente é a realidade de quem diz: "os marcianos não devem ter os mesmos direitos que nós". Aqui, estamos tratando de discriminação e violência institucional. Sobre a "morte aos marcianos", já discutimos acima.

Penso que temos que tomar o devido cuidado com os recentes fatos e narrativas do último processo eleitoral no Brasil, onde inúmeras ações e violências institucionais ou não, foram atribuídas a preconceitos. Em inglês solene, bullshit! O que vimos em todos os campos - políticos, religiosos, regionais, sexuais, etc - foi ódio, o mais puro ódio. Nada contra a disputa política, que invariavelmente acirra ânimos, mas tudo contra a banalização quase infantil que se comete ao atribuir tamanha violência àquilo que faz parte de nós, cotidianamente. No caminho inverso, outra violência é cometida contra aquele que diz "não gosto" e é taxado de preconceituoso. E por acaso somos obrigados a gostar de tudo e de todos? O débito da ética democrática é o do respeito (também confundido com tolerância) e da capacidade de compartilharmos os espaços concretos e abstratos com aquilo ou com quem não gostamos, pressuposto básico da vida em sociedades estáveis.

É claro que determinados conjuntos de preconceitos compartilhados por determinados conjuntos de pessoas podem incitar o ódio e a violência, mas para que isso ocorra, tais grupos devem ter como catalisadores um conjunto de concepções culturais e éticas devidamente cultivados e transmitidos pelos processos educativos da sociedade, e introjetados e percebidos como "científicos", quando na realidade, são dogmáticos. E é no campo dos conflitos inconscientes entre dogmas e ciências que encontramos a pólvora que pode jogar a democracia e a humanidade pelos ares.

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