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quarta-feira, 13 de abril de 2011

O recado da Islândia



Os jornais brasileiros trataram com muita discrição a segunda rejeição dos islandeses ao pagamento de 4 bilhões de euros ao Reino Unido e à Holanda por conta da quebra de um banco no colapso do sistema bancário da Islândia durante a crise financeira global de 2008.


O assunto é da maior relevância pois envolve a importante questão da socialização das perdas dos bancos privados que alguns países assumem como inexorável. Na irresponsável ciranda financeira que levou à crise mundial ,que ainda cobra seu preço, poucos ganharam. Mas na hora de pagar a fatura, todos os contribuintes são chamados a dar o seu quinhão.

Sob a palavra de ordem “não pagamos a crise deles”, os islandeses se mobilizaram, foram às ruas, derrubaram governo e tornaram público o debate da dívida. Uma primeira negociação indecorosa, proposta pelos credores, estabelecia o pagamento em apenas oito anos, entre 2016 e 2024, com juros de 5,5%. Incrivelmente, ela chegou a ser aprovada pelo parlamento islandês, mas o presidente Olafur Ragnar Grimsson se recusou a assinar o acordo, que acabou indo a referendo.

Em março desse ano, 93% dos islandeses disseram não ao pagamento da dívida. Uma nova proposta foi apresentada, com o pagamento em 30 anos, entre 2016 e 2046, e juros de 3,3% para o Reino Unido e 3% para a Holanda. E, novamente, os islandeses rejeitaram o acordo, com 60% de votos contrários.

A dívida surgiu com uma agressiva política dos bancos islandeses, que foram desregulados em 2001 em meio ao sonho neoliberal. Um dos maiores bancos do país, o Landsbanki, criou contas de poupança online no Reino Unido e na Holanda, sob o nome de Icesave, prometendo as melhores taxas de juros do mercado, acima de 6%. Naturalmente, não teve condições de honrá-las, deixando um rombo de 4 bilhões de euros. Os governos britânico e holandês decidiram por conta própria reembolsar os correntistas e querem que o contribuinte islandês pague a conta.

A Islândia foi severamente atingida pela crise financeira mundial e sua economia foi à bancarrota, com queda no PIB, cortes nos serviços públicos e crescimento do desemprego. Os contribuintes se recusam a aceitar como seu dever pagar pela irresponsabilidade de agentes financeiros privados que jogaram o país no caos. Reino Unido e Holanda não vão sair de mãos abanando, pois receberão dinheiro decorrente da liquidação do patrimônio do Landsbanki por parte do governo islandês. Deveriam se dar por satisfeitos.

A recusa democrática ao pagamento da dívida, que o mercado chamará de calote, trará sérias conseqüências. As notórias agências de risco irão rebaixar o país, a questão será levada aos tribunais e a intenção do governo da Islândia de ingressar na União Européia poderá ser barrada. Faz parte do jogo de pressões. Mas o recado dos referendos islandeses já está dado. Dívidas privadas não são dívidas públicas. E crises econômicas são questões políticas que devem ser tratadas pelas populações e não pelos mercados e governos.


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