Ter olhos puxados no Brasil é algo interessante. Desde criança, confundem-me com japoneses, chineses, coreanos, indonésios, vietnamitas, filipinos, entre outras nacionalidades do extremo oriente. É brasileiro nato quem nasce no Brasil. Nasci em Votorantim (SP) porque não tinha vagas em hospitais de Sorocaba (SP). Sou, portanto, brasileiro nato, porém, neto de japoneses.
Como descendente de japoneses, mantenho algumas tradições e alguns costumes, tal como frequentar a União Cultural e Esportiva Nipo-Brasileira de Sorocaba (Ucens), ouvir algumas músicas e ver alguns filmes orientais. Conheço algumas palavras e expressões do idioma japonês, e nada mais.
Interessante notar que ainda tem gente que me considera um não-brasileiro, apesar de ter Registro Geral (RG), Cadastro de Pessoa Física (CPF), carteira de identidade da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), emitidas por entidades nacionais.
Havia uma época em que me mandavam voltar para a minha terra. Minha terra? Matutava. Bom, eu não era e não sou proprietário de terras. Depois caiu a ficha. Mandavam-me voltar ao Japão. Mas como voltar ao Japão se eu nunca vim de lá? Mesmo que eu cometesse uma besteira federal não teria jeito de me “deportar”, “expulsar”, ou outra coisa do tipo, para lá, já que não tenho nacionalidade daquele país.
O preconceito, infelizmente, existe. E não é só contra os nipo-brasileiros, mas também contra os afro-brasileiros e demais minorias. Muito disso é por maldade, mas também tem muita falta de informação, que causa alguns episódios engraçados.
Quando estava no colegial (ensino médio), um rapaz de feições orientais entrou na sala e se sentou perto de mim. O cara ficou quieto, mudo. Puxei conversa, ele não me respondeu. Perguntei, em japonês, o nome dele. Novamente, ele não me respondeu.
Timidamente, ele disse que o seu nome era Ji Hyoung Woo, recentemente vindo de Seul, capital da Coréia do Sul. Apesar de o Japão e a Coréia do Sul terem travados conflitos no passado, nós dois tínhamos nada a ver com isso.
Começamos a conversar em português mesmo, depois formou um bolinho em nossa volta. O pessoal soube que ele era estrangeiro, aí, já viu. Meu novo amigo virou pop star. Chegou a professora e começou a se comunicar com ele por mímica, como se ele fosse surdo. Foi muito engraçado. Ela disse para mim: “Diz para ele que estamos à disposição para o que precisar.”
Eu olhei para ela meio pasmo. Talvez só pelo fato de ter olhos puxados, ela tinha pensado que eu sabia falar coreano. Respondi: “Mas eu não sei falar coreano, no máximo, algumas palavras e frases de japonês". De repente, um silêncio geral.
Creio que um passo enorme para nos tornarmos uma nação será quando não nos identificarmos mais pela cor da pele, mas pelos ideais em comum. Assim, seremos todos brasileiros.
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